Decidi escrever um pouco sobre Palinologia, em concreto sobre Palinoecologia, uma vez que é um assunto que para mim tem bastante interesse e que, além disso, envolve uma importante componente ecológica que relaciona a botânica e a entomologia.
Grãos de pólen. Ilustração de Wodehouse (1950). |
Antes de mais, para nos situarmos, a Palinologia é o estudo dos esporos, grãos de pólen e as suas mais variadas aplicações.
Esta vertente da Botânica iniciou-se por volta do séc. XVII mas foi com Erdtman, palinólogo sueco do séc. XX, que realmente sofreu um grande avanço.
Esporos e pólen, no seu conjunto, designam-se por palinomorfos.
As suas dimensões são muito variáveis (dos 5 aos 500 µm) e a exina - parede mais externa do palinomorfo - é constítuida por esporopolenina que é considerada, nada mais nada menos, a substância orgânica mais resistente produzida por seres vivos. Assim, estas estruturas, após o desaparecimento dos restantes componentes, podem manter-se relativamente intactas durante milhões de anos (há registos de pólen com 400 milhões de anos). Basta que se conservem em condições que dificultem a proliferação de microorganismos: baixa luminosidade, anoxia e pH ácido; tal como acontece nas turfeiras.
A palinologia aborda áreas relacionadas com as mais diversas actividades, indo desde o estudo do mel à palinologia forense.
Uma dessas áreas é a Palinoecologia que, entre outras coisas, se debruça sobre o estudo a dispersão polínica, naturalmente um processo fundamental para a reprodução das plantas.
Vectores de dispersão e a escultura (≈ ornamentação) do pólen
O pólen, consoante a família e o vector de dispersão, apresenta uma estrutura bastante diferente entre grupos.
Uma família pode ser estenopolínica ou europolínica, ou seja, pode apresentar pouca ou grande variedade no que concerne à morfologia dos palinomorfos.
Por exemplo, as gramíneas são estenopolínias: o seu pólen é normalmente pouco ornamentado, praticamente sem espinhos ou depressões, além de ter a exina muito pouco densa e um único poro. Um exemplo.
Já as compostas (Asteraceae) são euripolínicas e, sem dúvida, a família em que a escultura dos grãos se tornou mais complexa. Podemos, por exemplo, ter pólen equinado, cujos espinhos apresentam eles próprios espinhos de menores dimensões! Esta imagem ilustra alguns pólens equinados.
Ora, esta variedade na escultura e estrutura está naturalmente ligada à dispersão. Que sentido faria uma planta gastar recursos a produzir pólen bastante ornamentado se a dispersão for feita pelo vento? Apenas o tornaria menos eficaz por conta do peso acrescido.
Existem diversos tipos de dispersão, incluindo a hidrofilia (o vector é a água), mas os principais são dois.
O pólen de dispersão anemófila (pelo vento) não pode demasiado pesado (exina fina), não precisa de nenhuma ornamentação em especial porque não é necessário aderir-se ao corpo de nenhum vector (psilado ou simplesmente escábrido) e é, sobretudo, produzido em grandes quantidades já que a distribuição é muito mais incerta. Por exemplo, uma espiga de centeio pode produzir entre 2 a 5 milhões de grãos de pólen. É também disperso sobre a forma de mónadas.
Claro que, neste caso, também as plantas não apostam em flores exuberantes. Não possuem perfume e, além disso, o cálice e a corola estão reduzidos ou ausentes.
No caso da dispersão por animais, temos a entomofilia, ornitofilia, quiropterofilia e ainda outras formas mas, na nossa região, a que tem de facto importância é a primeira.
A dispersão por animais envolve estratégias praticamente opostas à anemofilia.
As flores possuem, em muitos casos, cores vistosas e aromas. O pólen tem a exina espessa e é por isso mais pesado, além de que a ornamentação é muito mais rica do que no caso anterior. Isto permite que o pólen adira ao corpo dos insectos e está, ainda, relacionado com o mecanismo de atracção electrostática pólen-insecto-estigma.
Síndromes de polinização
No séc. XIX começou a falar-se de síndromes de polinização, ou seja, as plantas apresentam características específicas que permitem que determinados vectores as polinizem em detrimento de outros, o que no caso de espécies animais, resulta da co-evolução entre polinizadores e plantas.
Hoje há uma visão um pouco diferente e sabemos que, no geral, plantas não são polinizadas unicamente por um grupo de animais, ainda que existam espécies verdadeiramente estritas. A maior parte das plantas situa-se numa zona cinzenta, ou seja, não é especializada num polinizador em especial mas apresenta, em vez disso, características que a permitem ser polinizadas por insectos bastante diferentes. Isto pode ser especialmente útil em situações em que as populações de um dado tipo de polinizador variam bastante consoante as épocas (é de referir que, ainda que menos vantajoso, muitas plantas se podem autopolinizar).
Por outro lado, a especialização num polinizador, pode ser vantajosa na medida em que esse animal irá apenas alimentar-se do pólen/ néctar de plantas da mesma espécie, logo, não distribuirá esse pólen por plantas de outras espécies, o que seria inútil e um desperdício de recursos para a espécie em questão.
Portanto, na natureza as coisas raramente são a preto e branco, o mais habitual é encontrar casos entre os extremos. Contudo, é natural que por via da morfologia, recompensas oferecidas/ "armadilhas", distribuição das flores, cores, odores etc...determinadas espécies de insectos tenham maior facilidade em polinizar algumas plantas em detrimento de outras.
As umbelíferas, como a da imagem, por conta das flores formarem um espaço amplo de "aterragem" permitem uma elevada gama de polinizadores. Sobretudo aqueles que necessitam de mais espaço, como o coleóptero da fotografia (Oenas sp.). É habitual encontrar nestas plantas diferentes dípteros, coleópteros, hymenópteros, lepidópteros...
//commons.wikimedia.org/wiki/File:Macroglossum_stellatarum_-_Hohe_Wand.jpg (spacebirdy / CC-BY-SA-3.0) |
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